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Caso aconteceu em junho, no Aeroporto de Caxias do Sul, e resultou em dois mortos, sendo um deles policial.
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Uma ação calculada nos seus mínimos detalhes e com pesado investimento financeiro para que desse certo. É isso que revela a investigação conduzida pela Polícia Federal (PF) sobre o assalto ao avião que transportava valores no Aeroporto de Caxias do Sul, em 19 de junho deste ano — considerado pelas autoridades o maior roubo da história do Rio Grande do Sul.
Duas pessoas morreram, entre elas um policial e um suspeito, durante uma troca de tiros. Em 70 dias, 13 suspeitos foram presos, conforme o delegaco Marcio Teixeira, à frente do trabalho.
O Fantástico, da TV Globo, detalhou neste domingo (29) a apuração dos policiais da Delegacia de Repressão a Crimes Contra o Patrimônio (Delepat), responsáveis por desarticular a quadrilha em apenas três meses de intenso trabalho.
Um dos pontos que a investigação revela é um método ousado para conseguir fugir do cerco policial feito pelas forças de segurança na Serra: a adaptação de uma van, um veículo com placas clonadas, para que tivesse uma faixa com a indicação de que era “escolar”.
Foi esse veículo que resgatou os assaltantes com fuzis e malotes que somavam R$ 14,4 milhões após eles abandonarem os carros no distrito de Galópolis, em Caxias do Sul. Assim, como se tivessem transportando alunos, eles conseguiram deixar inicialmente o acompanhamento das polícias.
Ao todo, 13 carros foram usados. Entre eles, caminhonetes Santa Fé blindadas e com logotipos falsos da PF.
Também foi descoberto o número de imóveis usados entre a preparação do roubo, a execução e a fuga: três sítios, um na área rural de Igrejinha, no Vale do Paranhana, outro sítio em Riozinho, também no Vale do Paranhana, e um terceiro em Alto Feliz, na Serra; e duas casas, uma na Vila Tupã, em Alvorada, e outra no bairro Monte Verde, em Farroupilha.
O Fantástico esteve no sítio em Igrejinha, que estava fechado. O local, segundo a apuração da PF, foi usado como um “QG” do crime: onde foram preparados os últimos detalhes do crime e escondidas armas em canos.
Parceria entre facções criminosas
A investigação ainda aponta uma parceria entre a maior facção do Brasil, o Primeiro Comando da Capital (PCC), com a facção gaúcha Bala na Cara, para a realização do crime. Pelo menos cinco criminosos diretamente vinculados ao PCC vieram de São Paulo para o Rio Grande do Sul. São ligados ao que é chamado na facção de “bateria” de assaltos, um pequeno grupo dentro da facção com bandidos especializados em roubos do tipo.
O bando ligado ao PCC é apontado como responsável por 23 assaltos do tipo no Brasil e até no Paraguai.
Identificação do ‘Gordão do PCC’
A investigação conta com interceptações telefônicas, cruzamentos de informações através de escutas telefônicas e o trabalho da perícia técnica da Polícia Federal, que identificou digitais dos bandidos nos imóveis — o que fornece uma prova de qualidade para o processo. Mas foi através da percepção dos investigadores sobre o vestuário que levou ao nome de um dos assaltantes ligados ao PCC.
Segundo a PF, Diego Rodrigues Andrade, o “Gordão do PCC”, usava o mesmo sapatênis nos assaltos de Cordeirópolis (SP), Camanducaia (MG) e Guarapuava (PR).
Em um áudio interceptado pela PF, a companheira dele fala sobre o tênis com uma amiga:
“Conheci pelo tênis, viu, que fica lá no meu sapatênis dele, preto, com uma lista branca assim do rabo, sabe? Mas Deus proverá já, já ele tá por aqui, se Deus quiser, viu”, disse.
Gordão está preso após a Polícia Civil de São Paulo encontrá-lo, em troca de informações com a PF após o roubo de Caxias.
Jurandir, o explosivista do PCC
A PF descobriu que o grupo levou a Caxias do Sul um especialista em explosivos, caso o plano executado não desse certo. Os bandidos calculavam que tinham cerca de 10 minutos entre o avião da empresa Protege, que trazia dinheiro para a Caixa Econômica Federal, tocar a pista de pouso e taxiar antes dos vigilantes pegarem o dinheiro e colocarem no carro-forte.
Caso os trabalhadores da empresa tivessem conseguido colocar o dinheiro nos veículos blindados antes da chegada da quadrilha, caberia a Jurandir da Silva Barros explodir os caminhões. Ele é um explosivista, homem destinado exclusivamente a esse tipo de ação.
“Você veja que eles tinham um expert em explosões. Por quê? Porque eles anteviam que de acordo com o momento que chegasse para abordagem esse dinheiro ou poderia estar dentro do carro forte, trancado, ou já em cofre, e que portanto eles precisariam serem explodidos. Então vê o nível de previsão e de organização deles”, declarou o procurador da república Celso Três, um dos integrantes do Grupo de Atuação Especializada no Crime Organizado do MPF que assina a denúncia contra o grupo.
A identificação dele no Rio Grande do Sul foi feita em outro trabalho de detalhes da PF. Os investigadores sabiam que Jurandir teria machucado o braço em uma explosão de um carro forte em Cordeirópolis. Ao recolher câmeras de segurança de postos de combustível no trajeto do roubo, agentes viram um homem com uma tala no braço. Era Jurandir, que acabou preso após informações repassadas pela Delepat para outras polícias.
Os chefes do assalto
Para a Polícia Federal, três homens são considerados os chefes do assalto. Um deles é um dos assaltantes mortos na troca de tiros dentro do aeroporto, chamado Guilherme Costa Ambrozio. Ele seria também o elo entre o PCC e a facção gaúcha. Gaúcho radicado em São Paulo, Ambrozio teria conexões com as duas quadrilhas.
Já Adriano Pereira de Souza, o Cigano, é apontado como um dos líderes do PCC na cidade de Guarulhos, na grande São Paulo, com maior capacidade intelectual que os demais e homem ligado ao dinheiro do grupo. Já ligado à facção gaúcha está Diego Moacir Jung, o Dieguinho, condenado a 48 anos de prisão e com passagens em 10 assaltos a banco desde 2003, inclusive com uso de metralhadora. Os dois estão presos.
Dezenove réus na Justiça
A PF indiciou dezessete pessoas, mas o MPF identificou, também, a participação de dois familiares de Dieguinho também no crime e, por isso, denunciou dezenove pessoas. Em 13 de setembro, a Justiça Federal aceitou a denúncia e tornou todos réus por latrocínio, roubo com morte, na forma consumada e tentada.
O entendimento é de que além de matarem o sargento da Brigada Militar Fabiano Oliveira, os envolvidos colocaram risco concreto de morte 13 funcionários das empresas de segurança e oito policiais militares presentes na cena do crime.
A PF destaca que apesar da conclusão da investigação, outros detalhes do crime ainda estão em investigação:
“Um crime de tamanha monta e com tantos envolvidos, pode ter outras pessoas participantes. Por isso, o trabalho da PF ainda não encerrou.”